Disponibilizo abaixo a tradução de importante matéria publicada pelo The Guardian, da Inglaterra, sobre Transtorno de Déficit de Atenção, realizada a partir de declarações dadas pelo renomado neurocientista Bruce D. Perry

Declarações de importantes cientistas como esta enriquecem o debate e abrem os olhos da sociedade para esta questão essencial que envolve a crescente medicalização de crianças com o metilfenidato.

Bruce D. Perry expõe em suas declarações os riscos e consequências do uso desses medicamentos por crianças e também as questões que envolvem o a estigmatização com o diagnóstico desta patologia duvidosa.

Sobre os métodos alternativos de tratamento, reforço que são eficientes, se trabalhados corretamente. Tenho tido experiências gratificantes com aplicação de práticas meditativas. Mas, para uma análise mais coerente para cada caso, classificar dificuldades de comportamento e atenção como TDAH é um erro primário, pois vê na criança a origem do problema. Precisamos é estar mais atentos aos ambientes e relações, nas complexidades da existência.

Recomendo a leitura da matéria, e que todos os envolvidos e interessados possam debater com os próximos sobre essa questão. Segue:

 

A hiperatividade infantil “não é uma doença real”, diz especialista americano.

Neurocientista diz que crianças estão sendo “rotuladas” com diagnósticos de TDAH, enquanto sua doença poderia ter outras origens.

Um dos neurocientistas mais proeminentes do mundo, cujo trabalho foi reconhecido pela ministra de Serviço e Pensões, Iain Duncan Smith, sugeriu que o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) não é uma “doença real”.

Na véspera de uma visita à Inglaterra para reunir-se com Duncan Smith e o secretário de saúde, Jeremy Hunt, o doutor Bruce D. Perry disse ao Observer que o rótulo de TDAH delineava uma ampla gama de sintomas. “O melhor é considerar como uma descrição. É notável observar que, da forma pela qual o diagnóstico é realizado, qualquer um de nós, a qualquer momento, poderia demonstrar pelo menos dois critérios”, ele disse.

Receitas para Metilfenidato, tais como Ritalina, usadas para tratar crianças diagnosticadas como portadora de TDAH, subiram 56% no Reino Unido, de 420 mil em 2007 para 657 mil em 2012. Considera-se que “psicoestimulantes” desta categoria estimulam uma parte do cérebro que altera reações mentais e comportamentais.

No entanto, Perry, sócio sênior da Child Trauma Academy em Houston, no Texas, disse que estava preocupado com crianças sendo rotuladas como portadoras de TDAH meramente por descreverem diversos sintomas relacionados a diferentes problemas fisiológicos. Os sintomas que levam a um diagnóstico de TDAH incluem falta de atenção, hiperatividade e impulsividade duradouras.

Perry acrescentou que médicos são ávidos para receitar psicoestimulantes a crianças quando evidências sugerem que não há benefícios a longo prazo. Estudos conduzidos com animais trouxeram à tona preocupações referentes ao potencial dano causado.

Perry, que também fará reuniões com o secretário de gabinete Sir Jeremy Heywood durante sua visita como convidado da Early Intervention Foundation, uma caridade voltada para engajar as causas originais dos transtornos infantis, disse: “O nível atual de evolução na realização de diagnósticos é muito imaturo. Cem anos atrás, se uma pessoa fosse ao médico apresentando sudorese e dor no peito, o médico diria ‘Ah, você está com febre’. Eles rotulariam, assim como nós rotulamos o TDAH hoje. É uma descrição, e não uma doença real.”

Ele acrescentou: “Se você der psicoestimulantes para animais enquanto eles são jovens, os seus sistemas de recompensa são alterados. Eles exigem muito mais estimulação para atingir o mesmo nível de prazer.”

“Então, falando em termos muito concretos, eles precisam de mais comida para ter a mesma sensação de saciedade. Eles precisam praticar mais atividades de alto risco para terem aquele pequeno barato de fazer algo. Não é um fenômeno benigno.”

“Usar medicação influencia sistemas de formas que nós ainda não compreendemos. Eu tendo a ser bastante cauteloso ao lidar com essa questão, especialmente quando a pesquisa mostra que outras intervenções são igualmente eficientes e, no decorrer do tempo, mais eficazes, sem apresentar qualquer efeito indesejável. Para mim é uma questão muito simples.

Perry disse que favorece uma abordagem que volte às causas originais do problema, e com frequência demanda que a atenção seja focada nos pais. “Existem diversas terapias não farmacológicas que têm mostrado boa eficácia. Muitas envolvem ajudar os adultos ligados as crianças.”

Parte do que acontece é que você encontra pais ansiosos e sobrecarregados, e isso é contagioso. Quando uma criança está tendo dificuldades, é comum que os adultos ao seu redor também sejam facilmente desequilibrados. Este processo de feedback negativo entre o professor ou pai frustrado e a criança alterada pode escalar e sair do controle.”

“É possível ensinar adultos a se tornarem mais equilibrados, a terem expectativas realistas em relação às crianças, a darem oportunidades mais alcançáveis, proporcionarem situações de sucesso e instruí-las quanto ao processo de ajudar crianças que estão passando por dificuldades.”

“Existem muitas abordagens terapêuticas. Algumas usam terapias somato sensoriais, como yoga, e outras atividades motoras, como bateria.”

“Todas têm alguma eficácia. Se for possível montar um pacote destas coisas: manter os adultos mais equilibrados, dar metas realistas para as crianças, dar oportunidades para que elas mesmas se tornem mais equilibradas, isso minimizaria uma porcentagem imensa dos problemas que tenho visto em crianças que são rotuladas como portadoras de TDAH.”

“O presidente da Early Intervention Foundation e ministro Graham Allen disse que Perry era o “melhor em seu campo”, e que já está encontrando políticos e membros do governo “convencidos pela filosofia de sua pesquisa. Eu diria que se for possível diminuir as experiências negativas na infância, isso eliminaria muitas causas de transtornos.”

Fonte: “The Guardian: Children´s hyperactivity is not a ´real disease´, says US expert” (https://www.theguardian.com/society/2014/mar/30/children-hyperactivity-not-real-disease-neuroscientist-adhd