Durante o meu mestrado, por dois anos estive refletindo e pesquisando sobre como os meninos comumente são vistos pela sociedade, ou como nós podemos conceber o que é ser menino. Para minha pesquisa foquei naquilo que pais de meninos dizem sobre o que é ser menino, mas este recorte foi apenas uma das possíveis escolhas dentre muitas outras facetas de nossa complexa rede social e cultural.

Fato é que, como psicólogo de crianças e adolescentes e que pela força de algumas contingências, majoritariamente psicólogo de meninos, tenho a perspectiva de quem vê a formação dos meninos a partir da elaboração de suas questões mais íntimas.

A ideia para a minha pesquisa de mestrado surgiu a partir dessa perspectiva. Eu percebia que muitos dos problemas apresentados pelos meninos estavam ligados a um conflito. Este conflito era entre suas próprias aspirações e as expectativas que outros impunham sobre como eles deveriam ser.

Sabemos através de pesquisas que homens geralmente se cuidam pouco. Vão menos ao médico, fazem menos terapia, falam menos do que sentem e apresentam mais problemas de saúde. Homens se envolvem mais em situações de violência, tanto como agressores como vítimas, sofrem mais acidentes de trânsito, etc.

Homens não choram. Essa é uma generalização, mas uma boa generalização. Claro que existem homens que choram. Mas é prática comum em nossa sociedade incutir no homem a ideia de que precisam ser mais fortes, mais estáveis e rígidos. A sensibilidade não é um bom atributo para quem precisa ser uma fortaleza ambulante, intransponível e intransigente para tudo aquilo que emerge do oceano de suas emoções.

Nos meninos isso não ocorre, ao menos até que sejam pressionados a serem “homens”. Meninos são sensíveis. Eles choram. Mesmo que só chorem no ambiente terapêutico, ainda sim, choram. Meninos também podem ser altamente empáticos e interessados nos sentimentos dos outros. Se preocupam e querem saber. Se tiverem espaço, falam de seus sentimentos com desenvoltura e interesse.

Nos anos em que sou psicólogo tendo tido a oportunidade de acompanhar alguns meninos desde a infância até a adolescência. Percebo que estes meninos cujas famílias valorizam o processo terapêutico como um elemento formador e não apenas como um meio para resolução de problemas, desenvolvem uma maior capacidade de falar de si, de perceber o outro. Tornam-se mais sensíveis e capazes de dar conta de si mesmos. Mais conhecedores de si mesmos, sabem fazer escolhas mais apropriadas, pois naturalmente buscam sentido para suas vidas.

A possibilidade de formarmos um ser humano capaz de escolher seu caminho com consciência, realizando seus propósitos, é real. A conexão com a subjetividade, o campo das emoções, as pulsões mais íntimas, é fundamental nesta busca. Percebo que o sofrimento dos meninos é caracterizado por esta desconexão, pois são constantemente pressionados a ser da forma como seus pais, a escola, a sociedade pensa que deveriam ser.

Deveria estar claro para nós que a masculinidade da maneira como é cultivada apresenta sérias questões que afetam a saúde mental e física da maioria dos homens. Enquanto os homens não aprenderem a entrar em contato consigo mesmos, continuarão presos em seus próprios condicionamentos, enrijecendo sua estrutura de caráter, tornando-se rígidos, sob risco de se tornarem negligentes e violentos consigo mesmos e com os outros ao redor. Acharmos que homens são autoritários, toscos, bobos, agressivos e intransigentes por natureza é uma cegueira moral e ética tremenda, pois é nítido que a origem desses comportamentos está na forma como os meninos tendem a ser educados.

Meninos apresentarão personalidades diferentes, diversas em suas possibilidades, diversas em seus modos de ser e estar no mundo. Meninos precisam chorar, pois é também através das lágrimas que podemos sentir e elaborar o que sentimos. Meninos precisam falar e expressar seus sentimentos sem medo de serem julgados, pois caso contrário, deixarão no esquecimento uma faceta essencial de suas vidas. Criarão, para si mesmos, uma armadilha que ora ou outra irá desencadear algum tipo de desordem mental.

É fundamental discutirmos e ponderarmos acerca deste assunto. De algum modo, estamos falhando na educação dos meninos devido ao peso de nossas expectativas e pela incompreensão do seu desenvolvimento. Além disso, também erramos pela falta de sensibilidade para acolher aqueles que não se encaixam no molde que a sociedade impõe sobre o que significa ser um menino.