Fui muito motivado por pensamentos que de alguma forma me ajudam a esclarecer o que sou, que me indicam percepções sobre o mundo ou mesmo que causam aquele arrepio de liberdade.

Na adolescência encontrei, por exemplo, um sujeito do século XIX chamado Nietzsche. Eu não entendia tudo o que ele dizia, mas suas palavras eram explosivas, causavam movimento, me inquietavam.

Quando jovem não tive a oportunidade de fazer terapia, mas lembro claramente que sempre estava em busca de alguém que pudesse oferecer uma palavra de acolhimento ou de sabedoria. E é certo que sou uma pessoa privilegiada, pois encontrei algumas pessoas muito interessantes pelo meu caminho.

Eu cresci e me tornei psicólogo e hoje estou nesse lugar de buscar a palavra para aqueles que me procuram. Ser psicólogo para mim é ser essa pessoa que busca incessantemente compreender as veredas da vida e, assim, transmitir centelhas de pensamentos que podem esclarecer, indicar ou arrepiar àqueles que também buscam se conhecer e conhecer o mundo, a vida.

É esse o papel dos “terapeutas” do passado também. Não vejo como mudar muito isso, a não ser os possíveis horizontes que se abrem para cada um que se oferece nessa missão de cuidar de “almas” humanas. Cada psicólogo, cada terapeuta, a partir de suas próprias vivência e conhecimento, oferece um tanto de si, seu modo próprio de Ser.

Para mim é muito duro testemunhar a “psicologia”, essa prática já tradicional em nossa civilização, sendo frequentemente apagada pela “técnica” diagnóstica, se afastando da arte de acolher e compreender o ser humano em suas muitas formas de expressão. O olhar indagador e curioso do terapeuta se perde nas descrições e conceitos já prontos e que prometem explicar todo o fenômeno humano.

Isto é sério, muito sério. Também o psicólogo é um filósofo, um artista do pensamento. O psicólogo exerce uma influência importante no modo como as pessoas percebem a realidade e a si mesmas. E tenho visto cada vez mais pessoas buscando compreender seus comportamentos a partir de possíveis transtornos já descritos na literatura. Ou eu sou isto ou sou aquilo. São tantos os sintomas enrijecidos pelos manuais de psiquiatria que o escopo de “transtornados” começa a se expandir para dimensões que deveriam minimamente causar certa estranheza.

Penso que se quando jovem tivesse sido encaminhado para um psicólogo desses que somente fazem avaliações e diagnósticos, talvez tivesse saído do consultório com a etiqueta de “TDAH”, com algum remedinho no bolso.

Assim, possivelmente eu não teria sido tão rebelde na escola, teria notas melhores em matemática. Mas como não fui diagnosticado, busquei me identificar com alguns personagens da literatura nos livros que li, com filósofos e artistas. Me via como sonhador, alguém que estava “no mundo da lua” buscando pedras preciosas, enquanto os reles mortais estavam se dedicando à chata tarefa de copiar a lousa na sala de aula. Hoje eu sei que foi na lua que encontrei o que me trouxe até aqui.

O que eu quero enquanto terapeuta é que cada um que me procura encontre a si mesmo e possa ser si mesmo. Não carrego etiquetas, nem rótulos. Conservo a curiosidade como princípio, a reflexão, o entendimento, os voos do pensamento, são estas as ferramentas que estão à minha disposição. Como bom sonhador, espero que a psicologia, a arte do pensar sobre a existência humana, reencontre sua essência.

 

Rafael L Menezes

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