Particularmente não sou muito adepto das celebrações de fim de ano. Nosso calendário cria uma situação de cansaço coletivo nessa época. São muitas reclamações, medos, ansiedades, misturadas com uma aparente possibilidade de mudança e descanso, que não costuma se concretizar.

Como sou psicólogo, não tiro férias nesse período. É uma escolha, claro, mas me baseio nas necessidades das famílias que atendo. Fato é que muitos precisam de apoio por causa das intensidades dos encontros e das angústias que surgem desse rito anual de “passagem”.

Não deixa de ser uma época representativa. De uma forma ou de outra somos convocados a pensar em um próximo ciclo. O que fazer, como viver, como reparar o que não nos serviu etc.

Com tanto barulho, tanto movimento, nos falta o recolhimento necessário para refletirmos sobre este momento. E isto nos deixa agitados.

Vejam, temos mais um ano pela frente! Queremos, eu sei, ter a visão necessária para compreender o que será deste próximo ano. Mas de barriga muito cheia e excesso de falatório, continuamos sem enxergar.

Isto não é um julgamento. Celebrem! Faz bem. Encontrem pessoas queridas, conheçam novos lugares. A vida também pede isto.

Mas não se esqueçam do necessário. Espero, desejo, que cada um possa encontrar seu cantinho, seu silêncio.

Se não pararmos para pensar no que estamos sentindo, para refletir e criar, entraremos no ano sem enxergar o que está nos conduzindo.

No meu lugar de terapeuta, observei especialmente neste ano o quanto uma vida irrefletida tem levado pessoas ao desespero, ao ponto de aceitarem qualquer pílula de explicação que lhes pudessem lhes aliviar o coração.

Vi crianças sendo diagnosticadas e medicadas sem necessidade. Tempo para pensar, compreender, cuidar no tempo certo? Não, soluções rápidas, técnicas, que resolvam o problema. Resolve? Claro que não.

Vi muita gente cansada, perdendo a vitalidade na busca de seus propósitos e aceitando qualquer caminho que também pudesse aliviar suas dores. Ou seja, eu quero já uma pílula de felicidade, ou qualquer sentido dado que me faça sentir melhor.

Uma vida sem reflexão é uma vida servil, apática.

Desejo a todos neste ano que se inicia que cada um encontre seu espaço de reflexão. Que encontre silêncio para escutar os próprios sentimentos e os próprios pensamentos.

Desejo vitalidade para que este pensar prospere em novas ideias e possibilidades.

Por um mundo menos apático.

E por uma psicologia mais humana.

Felicidades, 2023!